Caminho para Deus 74 – A misericórdia de Deus

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 O Senhor Jesus «veio  para revelar  até o mais profundo que Deus é amor»[1], revelou este amor  «com a palavra e com a ação»[2] e, finalmente, com sua cruz e com sua ressurreição mostra «até que extremo chega este amor paterno de Deus»[3].

    O Filho, com suas palavras e em si mesmo, tem-nos mostrado que o Pai não permanece impassível e indiferente diante do drama humano, senão que se comove interiormente e com prontidão sai ao encontro de sua criatura humana ferida pelo pecado: Deus é rico em misericórdia! Tal amor paternal e misericórdia para com o homem a retratou o Senhor Jesus –para todos os homens de todas as gerações– em especial em uma comovente parábola: é a chamada parábola do filho pródigo e do pai misericordioso, parábola na qual a misericórdia do Pai sai ao encontro da miséria do filho para reconciliá-lo e abri-lo à sua própria dignidade: «Só o coração de Cristo que conhece as profundidades do amor de seu Pai, pode revelar-nos o abismo de sua misericórdia de uma maneira tão cheia de simplicidade e de beleza»[4].

    Em e pelo Senhor Jesus, o Filho feito homem, o Pai  tem se aproximado humildemente de cada ser humano, oferecendo-lhe o grande Dom da reconciliação. O Senhor Ressuscitado, «o mesmo ontem, hoje e sempre »[5], estará sempre vivo e presente em sua Igreja[6]  até o fim dos tempos[7]. É Ele quem, pelo ministério de sua Igreja, oferece-nos hoje o perdão sacramental e a indulgência e deste modo convida a todos a ingressar e participar intensamente no dinamismo do encontro transformador com a misericórdia do Pai, de modo que cheguemos a brilhar diante de todos os homens como «sinais vivos e eficazes de seu amor misericordioso»[8].

O perdão sacramental

    Logo após o Batismo, a «vida nova de filho de Deus pode ser debilitada e inclusive perdida pelo pecado»[9]. O cair de maneira consciente e livre em pecado faz com que nos afastemos novamente de Deus, experimentando as múltiplas e dolorosas fraturas -interiores e exteriores- que são conseqüência daquela ruptura fontal.

 O Senhor Jesus, conhecendo nossa fragilidade, quis «que sua Igreja continuasse, com a força do Espirito Santo, sua obra  de cura e de salvação, inclusive em seus próprios membros»[10]. Com efeito, a Igreja recebeu do Senhor Jesus o poder de perdoar os pecados em seu nome[11], encargo que exerce no Sacramento da Reconciliação. Ao confessar seus pecados neste sacramento instituído por Cristo, o batizado recupera a comunhão com o Pai e com sua Igreja[12]. Por isso é que podemos dizer que a Igreja é no mundo a presença viva de Deus que se inclina sobre toda debilidade humana para acolhe-lha no abraço de sua misericórdia.

A “indulgência”

    A reconciliação com Deus, entretanto, não exclui a permanência de algumas conseqüências do pecado, das quais é necessário purificar-se. Com efeito, ainda que perdoado verdadeiramente, permanecem no homem as conseqüências negativas que produz o pecado. É o que a tradição teológica tem chamado “penas” e “restos”  do pecado. É justamente mediante a indulgência pela qual o pecador, já perdoado enquanto à culpa, também é perdoado da chamada pena temporal[13].

    O ponto de partida para compreender a indulgencia será sempre a abundância de misericórdia de Deus, manifestada na Cruz reconciliadora do Filho. O Senhor crucificado é a fonte de toda indulgencia, é Ele mesmo a grande “indulgencia” que o Pai oferece à humanidade para o perdão das culpas e para devolvê-lo a capacidade de viver a mesma vida do Filho[14], graças ao dom do Espirito Santo[15].

    É através do ministério de sua Igreja que Deus estende no mundo sua misericórdia através dos séculos: «nela se manifesta a plenitude da misericórdia do Pai, que sai ao encontro de todos com seu amor, manifestado em primeiro lugar com o perdão das culpas»[16], mas o faz também mediante aquele dom que está em estreita conexão com o Sacramento da Reconciliação, dom que recebe o antigo nome “indulgência”.

Encontro transformador: para a vida cristã plena

    Pois bem, o perdão sacramental concedido de forma gratuita por Deus «implica como conseqüência -por parte de quem foi perdoado- uma mudança real de vida,  uma progressiva eliminação do mal interior, uma renovação da própria existência»[17], implica «um processo laborioso, em que participam o homem, com seu compromisso pessoal, e a Igreja, com seu ministério sacramental»[18].

    Tampouco o dom da indulgência  pode ser compreendido em seu sentido autentico se não é no «horizonte total do homem»[19]: as indulgências -ajudas especiais que se nos oferecem com maior abundância no Ano Santo- «longe de ser uma espécie de “desconto” com respeito ao compromisso de conversão, são uma ajuda para um compromisso mais firme, generoso e radical»[20].

    Quer dizer, para obter o perdão e ganhar a indulgência não se trata de contentar-se com realizar simplesmente algumas atividades exteriores e “cumprir com os requisitos”. Nada mais afastado do sentido autêntico do sacramento do perdão e do dom da indulgência! Estes devem ser expressão e apoio do caminho de conversão. Trata-se de encontrar-nos com a misericórdia do Pai e colaborar com sua dinâmica transformadora em nossa vida quotidiana! Trata-se de «empreender um caminho de purificação para a plenitude do amor»[21], de «empreender o caminho de uma vida em  plenitude»[22] !

Citas para a oração

O Senhor Jesus nos revela ao Pai misericordioso:

  • Revela ao Pai: Jo14,6-11; Ele é misericordioso: Lc 15,11-32, rico em misericórdia: Ef 2, 4-5 e Pai das misericórdias: 2Cor 1,3.

Deus porque ama ao homem:

  • Anseia que viva: Ez 18,23; perdoa sempre a quem volta: Ez 18,23; Sl 32,4; 103,3.8-14; Ef 2,4-5; 2Cor 1,3; é terno com todos: Sl 103, 11-14; é fiel; 2Tm 2,13; Ex 34,7; envia a seu Filho: Jo 3,16.

Na igreja se manifesta a misericórdia de Deus:

  • Enviado pelo pai com poder para perdoar os pecados: Mt 9,2-6; Mc 2,10; Lc5,24; o Senhor Jesus transmite a sua Igreja esse poder (instituição do Sacramento do Perdão): Jo 20,22-23; pelo ministério da Igreja recebemos o perdão dos pecados: Mt 28, 18-19; At 2,38; quem confessa seus pecados, é perdoado: 1Jo 1,9.
  • Hoje e sempre, o Senhor Jesus é nossa indulgência: Rm 3.23-25.

Chamados a ser sinais vivos e eficazes do amor misericordioso do Pai: Lc 10,36-37; Ef 4,32; Tm 1,15-16;  Cl 3,12-14.



[1] S.S. João Paulo II, Homilia de 31/01/88, n.3.

[2] Ali mesmo.

[3] Ali mesmo.

[4] Catecismo da Igreja Católica, 1439.

[5] Hb 13,8.

[6] Ver Ecclesia in America, 12.

[7] Ver Mt 28,20.

[8] Mensagem do Santo Padre para a quaresma do ano 2000, n.6.

[9] Catecismo da Igreja Católica, 1420.

[10] Catecismo da igreja Católica, 1421.

[11] Ver Mt 16, 19; Jo 20,23.

[12] Ver Catecismo da Igreja Católica, 1422 e ss.

[13] Ver Catecismo da Igreja Católica, 1471.

[14] Ver Jo 1, 12-13.

[15] Ver Gl 4,6; Rm 5,5; 8,15-16.

[16] Ver IM, 9.

[17] Ali mesmo.

[18] Catequese do 29/9/99.

[19] Ali mesmo, n.4.

[20] Ali mesmo, n.5.

[21] Ali mesmo, n.4.

[22] Mensagem do Santo Padre para a Quaresma do ano 2000, n.4.

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