Meditações de São João XXIII para rezar os mistérios dolorosos do Rosário

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Primeiro mistério: A oração de Jesus no horto

Contemplação

Com ânimo comovido volta-se uma e outra vez sobre a imagem de Jesus na hora e lugar do supremo abandono. “E transpirou como grossas gotas de sangue, que escorriam até a terra” (Lc 22,44). Pena íntima na sua alma, amargura insondável na sua solidão, decaimento no corpo abrumado. A sua agonia não se estende mais senão pela iminência da sua paixão, que Jesus, a partir de agora, já não vê longínqua, nem sequer próxima, senão presente.

Reflexão

A cena de Getsemani nos conforta e anima a realizar um esforço voluntário de aceitação. A aceitação incondicional do sofrimento, quando é Deus quem o quer e permite: “Não se faça a minha vontade, mas a tua” (Lc 22,42). Palavras que desgarram e curam, porque ensinam a que grau de fervor pode e deve chegar o cristão que sofre, unido a Cristo que sofre. Elas nos dão, como em última pincelada, a certeza de méritos inefáveis, o merecimento da vida divina para nós, vida palpitante hoje em nós pela graça, amanhã na glória.

Intenção

Neste mistério se apresenta diante do nosso olhar uma intenção particular: “a preocupação por todas as Igrejas” (2Co 11,28). Solicitude que impulsiona com premência a oração diária do Santo Padre, como o vento que açoitava o lago de Genezaret, “vento contrário” (Mt 14,24). Pensamento anelante nas situações mais comprometidas do seu altíssimo ministério pastoral. Preocupação pela Igreja, espalhada pela redondeza do mundo, sofre unida a ele, e ele, por sua parte, unido a ela, presente nele e sofrendo com ele. Afã dolorida por tantas almas, porções inteiras do rebanho de Cristo, sujeitas a perseguição, sem a liberdade de crer, de pensar, de viver. “Quem desfalece que eu não desfaleça?” (2Co 11,28).

“Participar na dor do próximo, padecer com quem padece, chorar com quem chora” (Rm 12,15) é um benefício, um mérito para toda a Igreja. A “comunhão dos santos” é este ter em comum, todos e cada um, o Sangue de Cristo, o amor dos santos e dos bons, e, também, meu Deus, nossos pecados, nossas debilidades. Pensa-se o suficiente nesta “comunhão”, que é união, e, como diria Jesus cristo, quase unidade “que sejam um” (Jo 17,22)? A cruz do Senhor não só nos eleva senão que atrai as almas. Sempre. “E eu, quando for levantado da terra, atrairei a todos para mim” (Jo 12,32).  Todo. A todos.

 

Segundo mistério: A flagelação do Senhor

 Contemplação

O mistério traz à lembrança o suplício impiedoso de chicotadas inumeráveis sobre os membros santos e imaculados do Senhor.

O homem é corpo e alma. O corpo está sujeito a tentações humilhantes. A vontade, mais débil ainda, pode ser arrastada facilmente. Acha-se no mistério uma chamada à penitência que é salutar porque implica e causa a verdadeira saúde do homem, por ser higiene do vigor corporal e juntamente conforto em ordem à salvação espiritual.

Reflexão

Daqui se desprende um valioso ensinamento para todos. Não estaremos chamados ao martírio sangrento, mas à disciplina constante e à diária mortificação das paixões, sim. Por este meio, verdadeira “via sacra” de cada dia, inevitável, indispensável, que em ocasiões pode inclusive chegar a ser heroico em suas exigências, chega-se passo a passo a uma semelhança cada vez mais estreita com Jesus Cristo, à participação em seus méritos, à ablução por seu Sangue imaculado de todo pecado em nós e nos demais. Não se chega a isto por fáceis exaltações, fanatismo, oxalá inocente, jamais inofensivo.

A Mãe, dolorida, o viu assim, flagelado. Pensemos com quanta amargura. Quantas mães gostariam de poder gozar do sucesso na perfeição dos seus filhos, dispostos, iniciados por elas na disciplina de uma boa educação, em uma vida sadia, e em vez disso têm que chorar a perda de tantas esperanças, a dor de que tantos esforços tenham se perdido.

Intenção

Nas ave-marias do mistério pediremos ao Senhor o dom da pureza de costumes na família, na sociedade, particularmente para os corações jovens, os mais expostos à sedução dos sentidos. E juntamente pediremos o dom da firmeza de caráter, e da fidelidade a toda prova aos ensinamentos recebidos, aos propósitos feitos.

 

Terceiro mistério: A coroação de espinhos

Contemplação

A contemplação do mistério orienta de modo particular àqueles que levam o peso de graves responsabilidades na sociedade. É, com efeito, o mistério dos governantes, legisladores, magistrados. Sobre a cabeça de Cristo, rei, uma coroa de espinhos. Sobre a deles também outra coroa, inegavelmente dotada de dignidade e excelência, símbolo de uma autoridade que vem de Deus e é divina, mas que leva em seu suas fibras elementos que pesam e ferem, e causam perplexidade, e chegariam inclusive à amargura. Espinhos e desgostos, em fim. Sem falar da dor que causam as desgraças e culpas dos homens quando são amados e têm o dever de representar diante deles o Pai celestial. Então o mesmo amor chega a ser, como para Jesus Cristo, uma coroa de espinhos com que corações duros ferem a cabeça de quem lhes ama.

Intenção

Poderia parecer outra aplicação útil do mistério pensar na grave responsabilidade de quem por ter recebido mais talentos, está por isso mesmo mais obrigado a faze-los frutificar com abundância, por meio do exercício constante das suas faculdades, da sua inteligência. O serviço do pensamento, quero dizer, o que se espera de quem está melhor dotado, como luz e guia dos demais, deve prestar-se com paciência serena, rejeitando as tentações de orgulho, de egoísmo, do distanciamento que destrói.

 

 

Quarto mistério: Cristo carregando a Cruz

Contemplação

A vida humana é um continuo caminhar, longo e pesado. Sempre para cima, por uma pendente áspera, pelos passos marcados a todos no monte. Neste mistério Jesus Cristo representa o gênero humano. Ai, de nós se a sua cruz não fosse para nós! O homem, tentado de egoísmo e dureza, sucumbiria no caminho, mais tarde ou mais cedo.

Reflexão

Contemplando Jesus Cristo que sobe ao Calvário, aprendemos, antes com o coração do que com a mente, a abraçar-nos e beijar a cruz, a leva-la com generosidade, com alegria, segundo as palavras do Kempis: “Na cruz está a salvação, na cruz a vida, na cruz está a defesa contra os inimigos, nela a infusão de uma suavidade soberana” (Imitação de Cristo, Livro II, 12, 2).

E como não estender nossa oração a Maria, a Mãe Dolorosa que seguiu Jesus, com um espírito de total participação em seus méritos, nas suas dores?

Intenção

Que o mistério faça passar diante do nosso olhar o espetáculo inenarrável de tantos seres atribulados: órfãos, anciãos, enfermos, aleijados, prisioneiros, desterrados. Peçamos para todos eles a força, o consolo capaz de dar esperança. Repitamos com ternura, e, por que não?, com alguma lágrima escondida: “Salve, cruz, única possível esperança” (Hino de Vésperas do Domingo I da Paixão).

 

Quinto Mistério

A Crucificação do Senhor

Contemplação

“A vida e a morte se abraçaram em um duelo sublime” (Missal Romano, Sec. De Páscoa). A vida e a morte representam os pontos chaves e resolutivos do sacrifício de Cristo. Com o seu sorriso de Belém, que prende nos lábios de todos os homens no alvorecer da sua aparição sobre a terra; e seu desejo e último suspiro na cruz, que uniu ao seu todas as nossas dores para santifica-las, que expiou todos os nossos pecados, cancelando-os em fim, eis ai a vida de Jesus entrando na nossa. E Maria está junto à cruz, como esteve junto ao Menino em Belém. Supliquemos a Ela que é mãe; peçamos-lhe que também ela interceda por nós “agora e na hora da nossa morte”.

Reflexão

Poderia se ver neste mistério o rascunho da sina misteriosa daqueles homens que jamais saberão –e que pena imensa que seja assim- do sangue que foi derramada em favor deles pelo Filho de Deus. E sobretudo, o dos pecadores obstinados, o dos incrédulos, o daqueles que receberam e recebem, e rejeitam depois, a luz do Evangelho.

Intenção

Pensando nisto a oração se submerge em um desejo magnânimo, em uma veemência reparadora, em um horizonte mundial de apostolado. E pede-se, com grande fervor, que o preciosíssimo Sangue derramado por todos os homens, dê no fim, e dê a todos eles, conversão e salvação. Que o Sangue de Cristo seja para todos penhor e prenda de vida eterna.

 

 

 

Membro do Sodalício de Vida Cristã desde 1996. Nascido no Peru em 1978, mora no Brasil desde 2001. Por muitos anos foi professor de Filosofia na Universidade Católica de Petrópolis. Atualmente faz parte da equipe de formação do Sodalício, é diretor do Centro de Estudos Culturais e desenvolve projetos de formação na Fé e evangelização da cultura para o Movimento de Vida Cristã.

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