Não quero saber de nada

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A palavra liberdade exerce sobre todos nós uma poderosa influência. Quem não deseja ser realmente livre? Mas, o que é a liberdade? Será que ela significa simplesmente a ausência de compromisso, o viver sem nenhum tipo de condicionamento, poder fazer qualquer coisa sem ter que assumir qualquer consequência pelos nossos atos?

A verdade é que essa noção de liberdade, a de ausência de compromisso ou, quiçá, a de qualquer tipo de vínculo com pessoas, instituições, projetos, tarefas, é uma ilusão, que podemos constatar perguntando-nos se alguma vez tivemos uma experiência que se assemelhe a isso.

Eu gosto muito da definição que dá Santo Agostinho da liberdade, e acho que nos pode ajudar. Ele diz que “a liberdade é a capacidade que todos nós tempos para realizar o bem”. Claro, como uma espécie de subproduto, consequentemente, também se abre diante de nós a possibilidade de realizar o mal. Obviamente, é uma possibilidade não desejada pelo Criador. É uma espécie de risco que Ele corre quando nos cria, que só se justifica pela capacidade de realizarmos o bem no mundo.

Não é possível, é simplesmente desumano abster-se sistematicamente de tomar certas decisões, de tentar optar por um entre vários caminhos que se abrem diante de nós, em diferentes ocasiões, sejam elas corriqueiras ou decisivas e extraordinárias. Essas decisões vão condicionando, dando contornos cada vez mais definidos às opções disponíveis que teremos no futuro. Não significa que sejamos menos livres; pelo contrário, significa que vai ficando cada vez mais claro o caminho concreto no qual esta nossa liberdade se desdobrará e amadurecerá.

Um exemplo é o casamento, ou a vocação ao sacerdócio ou à vida consagrada. Uma vez que eu caso com outra pessoa, ou quando assumo diante de Deus um compromisso por toda a vida, isso significa que fica mais definido o caminho concreto, as coordenadas nas quais eu realizarei o bem. Trata-se de um passo de amadurecimento, de maioridade na fé e na vida moral, pelo qual, sem saber exatamente as cruzes, desafios e dificuldades que enfrentarei no futuro, coloco meu coração e minha confiança no Senhor, que me chama a assumir um compromisso com Ele e com o meu próximo.

Não querer saber de nada” é, no fundo, renunciar a ser homem e mulher de verdade. Significa não amadurecer e não tomar posse realmente da própria existência. Por querer salvar uma imagem idealizada da liberdade, acabamos por renunciar à própria liberdade, cujo exercício humano sempre se dá em determinadas circunstâncias e condições, as quais se vão tornando cada vez mais definidas, quanto mais nos arriscamos a tomar decisões, a exercer esta nossa liberdade. Isso trará consequências pelas quais somos responsáveis. Isso é difícil, pois, muitas vezes podemos errar e até pecar. O importante, então, é acolher-se à misericórdia de Deus, que de tudo saberá tirar coisas boas. Não podemos esquecer, também, de que nada escapa a Seu olhar providente.

Martin Ugarteche Fernández
Membro do Sodalício de Vida Cristã desde 1996. Nascido no Peru em 1978, mora no Brasil desde 2001. Por muitos anos foi professor de Filosofia na Universidade Católica de Petrópolis. Atualmente faz parte da equipe de formação do Sodalício, é diretor do Centro de Estudos Culturais e desenvolve projetos de formação na Fé e evangelização da cultura para o Movimento de Vida Cristã.

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