Os mistérios luminosos e a "hora" de Jesus

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Nas vésperas do início da Semana Santa, na qual acompanharemos Jesus nos seus últimos passos para a sua “Hora”, meditamos hoje nesse momento fundamental da vida do Senhor, ao ritmo dos mistérios luminosos do Santo Rosário.

 

Primeiro mistério: O Batismo no Rio Jordão

Esta passagem coloca em cena João Batista, figura que conjuga em sim, de maneira única, o binômio precursor e discípulo. É a “voz que clama no deserto”, preparando os caminhos para o Messias. Na cena do Batismo, João sabe que não é digno nem sequer de desatar a sandálias de Jesus, mas aceita batizá-lo porque assim o pede o Plano de Deus. Em certa ocasião disse Jesus: o discípulo não pode esperar um destino diferente ao do seu Mestre. Se eu sou perseguido, vocês também o serão. São João Batista -precursor e discípulo ao mesmo tempo- participa também da “hora” de Jesus. Sofre a perseguição e a morte por causa da verdade. Não apenas a mensagem de conversão, mas também seu próprio testemunho de vida austera e simples era sinal de contradição no tempo que lhe tocou viver.

 

Segundo mistério: As bodas de Caná

Depois do Batismo de Jesus, começa a sua vida pública, o chamado dos primeiros discípulos, o início da pregação. Maria, que por tantos anos se manteve em silente espera, esperando que o seu Filho agisse de acordo com a sua identidade messiânica, intervém diretamente nas Bodas de Caná, pedindo ao seu Filho que fizesse o milagre da transformação da água em vinho. A reação de Jesus é desconcertante. Depois de uma primeira resposta, interpretada por muitos como uma reprimenda, faz imediatamente o milagre. O pedido de Maria parece implicar um pedido para que Jesus seguinte adiante com a sua missão, apenas começada. Ao mesmo tempo, a primeira resposta de Jesus revela a sua tensão interior: “Ainda não chegou a minha “hora””. A cada dia que passa, a cada sermão, a cada milagre, a cada disputa com os inimigos, que vão se multiplicando, essa “hora” se aproxima. E a atitude de Jesus perante ela revela seu caráter tremendo. É a “hora” da sua entrega total na Cruz, da salvação do gênero humano, mas também a “hora” das trevas, em que muitos corações se fecharão à graça, optando por afastar-se de Deus.

 

Terceiro mistério: O Anúncio do Reino

Toda a missão de Jesus pode se resumir no anúncio da chegada do Reino. Fixemos agora a atenção a um momento no qual esse anúncio assume contornos dramáticos. No Alto da Cruz, agonizante, Jesus ainda continua cumprindo a sua missão, procurando que mais e mais pessoas se convertam ao Pai, aceitando seu reinado em seus corações e ajudando também a instaurá-lo no mundo. É o caso do Bom Ladrão que, crucificado ao lado de Jesus, pede ao Senhor que se lembre dEle quando esteja em “seu Reino”. A passagem é comovente e nos enche de esperança, pela resposta do Senhor: “hoje estarás comigo no Paraíso”. Esse é o mesmo destino que nos espera se fazemos como o Bom Ladrão, pedindo perdão pelos nossos pecados e abrindo o nosso coração à graça de Deus. Que a Semana Santa, que amanhã começa, seja ocasião para que façamos esse exercício!

Quarto mistério: A Transfiguração

Na perspectiva da proximidade da “hora” de Jesus, três dos apóstolos –Pedro, Tiago e João- recebem a bênção de ver o Senhor transfigurado no alto do monte Tabor. A “hora” do Mestre será também uma dura prova para eles. Quase todos fugirão, abandonarão Jesus, fraquejarão na Fé. Muitas vezes Deus nos manda essas bênçãos, que são relíquias que guardamos para os momentos duros, de prova. João, que esteve no Tabor, presenciaria também a crucificação, a “hora” de Jesus, em outro monte: o Gólgota. Lá ele verá esse mesmo rosto, hoje transfigurado, desfigurado pela Paixão, coberto de sangue e crostas secas, assim como dos cospes e a sujeira do chão por causa das quedas. Mas para João a “hora” da Paixão é, paradoxalmente, também a hora da exaltação do Senhor, da sua entrega total ao Pai, do seu amor por nós até o extremo, do cumprimento pleno da sua missão. Como Ele mesmo tinha dito: ninguém tira a vida dele, mas Ele a dá, para salvação do mundo. “Em tuas mãos entrego o meu espírito”. Com estas palavras, plenas de senhorio, registradas por João, Jesus alcança os maiores cumes do espírito, enquanto a sua experiência sensível se reduz, como lembrava o Papa São João Paulo II, a um deserto.

 

Quinto mistério: A instituição da Eucaristia.

Na quinta-feira santa a Igreja celebra, no início do Santo Tríduo Pascal, a instituição da Eucaristia na missa da manhã e a do lava-pés na missa vespertina. Esses dois mistérios compartilham como fundamento o amor do Senhor por nós, que “chega até o extremo”. O Sacrifício da Eucaristia está intimamente relacionado com o da Cruz, e é como a sua continuação, pois nele Jesus nos dá seu corpo e sangue para a nossa salvação. E o gesto do lava-pés, reservado aos escravos, tem a sua continuação na Cruz, lugar no qual Cristo derrama seu sangue para purificar-nos do pecado. Uma gota, diz Santo Tomás, seria suficiente para fazê-lo. Mas na entrega total por nós Jesus nos mostra a superabundância do seu amor, por cada um de nós.

Martin Ugarteche Fernández
Membro do Sodalício de Vida Cristã desde 1996. Nascido no Peru em 1978, mora no Brasil desde 2001. Por muitos anos foi professor de Filosofia na Universidade Católica de Petrópolis. Atualmente faz parte da equipe de formação do Sodalício, é diretor do Centro de Estudos Culturais e desenvolve projetos de formação na Fé e evangelização da cultura para o Movimento de Vida Cristã.

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