Quanto mais materialista a cultura vai se tornando, mais difícil fica de falar sobre realidades que não são tão evidentes para nós, que não nos são imediatas. Hoje em dia não se preza muito pela reflexão e esta é, algumas vezes, vista como perda de tempo, como algo que pode atrapalhar esse frenesi de coisas para fazer buscando sabe-se lá Deus o que. Nesse terreno pouco fértil, é difícil ter contato com o interior de cada um de nós de forma serena e, sem isso, realidades como a Alma e o próprio Deus, vão sendo cada vez mais deixados de lado.
O conceito de alma, na filosofia grega e depois na síntese feita por São Tomás de Aquino, corresponde mais ou menos àquilo que faz com que o corpo seja um corpo vivo. Uma pedra, por exemplo, tem alma, porque não é um corpo vivo. Uma planta, segundo esses filósofos, tem uma alma vegetativa, que possui suas características de nutrição, crescimento e reprodução. Em um outro nível estão os animais com sua alma sensitiva que, simplificadamente, permite o movimento e a percepção. O homem está em um outro nível, pois possui a alma racional, que tem na faculdade intelectiva, ou seja, o poder conhecer racionalmente, o ponto alto do seu ser.
Hoje em dia muito tem se feito por salvar os direitos dos animais. Não há nada de errado em buscar uma correta interação com a criação, pelo contrário, é nosso dever cuidar bem daquilo que Deus nos concedeu, como o Papa Francisco alentou em sua encíclica “Laudato si”. Mas em alguns momentos parece que há uma tentativa de humanizar os animais ou de animalizar o homem que manifesta uma falta de conhecimento dessa diferença entre nós e eles. Por mais “inteligentes” que os nossos cachorrinhos possam ser, é mais ou menos evidente que eles não estão no mesmo nível que nós. De novo, isso não nos dá o direito de maltratar a criação, pelo contrário, aumenta a nossa responsabilidade para que ela seja bem cuidada.
Essa tendência, aliás, é também em certo sentido uma manifestação de uma cultura mais materialista que não consegue perceber alguns atos humanos como transcendentes a matéria. Hoje não é incomum achar pessoas que igualam os seres humano aos animais ao dizer que todos, no final das contas, seguimos os nossos instintos. É preciso reagir contra isso fortemente porque essa maneira de ver reduz drasticamente a obra de Deus no homem. Deus nos fez livres para amar. Somos capazes de atos amorosos que vão além da que os animais podem fazer. E se não conseguimos enxergar isso, é porque realmente estamos muito envolvidos por essa cultura que nega o transcendente. O próprio pecado é uma manifestação, muito infeliz, da nossa diferença com os animais. Eles não podem pecar.
A grande “prova” da existência da alma está em cada um de nós se dermos o espaço e o silêncio necessário para escutar o nosso interior. Santo Agostinho, em seu processo de conversão, disse que procurou por Deus em muitos lugares quando Ele estava presente no mais profundo do seu ser. A Igreja entende que a Alma humana possui esse lugar na alma, o “fundo da alma”, que é o lugar próprio em que Deus habita em nós. E se queremos entrar em contato com Ele, como Santo Agostinho, precisamos urgentemente fazer silêncio e não nos deixar levar pelo mundo que uma e outra vez, de diversas maneiras, nos puxa para a superfície, para a animalidade, impedindo que toda a riqueza pessoal se aflore de verdade.