Essa frase, a de buscar ser “a melhor versão de si mesmo”, tem alguma coisa a ver com a vida cristã? Um cristão deve buscar ser o melhor possível como meta principal da sua vida?
Em certa ocasião, Jesus disse aos seus discípulos, “deveis ser perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito” (Mt 5,48). Se buscar a perfeição é o mesmo que buscar ser “a melhor versão de si mesmo”, parece então que se trata de uma meta coerente com o que o Senhor nos ensina.
Encontraremos diferença, quiçá, no que se refere ao conteúdo dessa “perfeição” que buscamos. Em que ela consiste? Ao ser questionado sobre qual seria o principal mandamento, Jesus nos ensinou a amar a Deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo (Cf. Mt 22,37-39).
Essa perfeição consiste, então, para o cristão, no amor. De fato, o Concílio Vaticano II, na Gaudium et Spes, nos ensina que o homem somente se entende a si mesmo no sincero dom de si (n. 24). A perfeição do cristão consiste, então, numa entrega generosa aos demais por amor.
Nos seus ensinamentos éticos, Karol Wojtyła, quem depois se tornou o grande Papa João Paulo II, considerava que o principal objetivo da ética era explicar como assim o homem se torna bom realizando o bem e mau realizando o mal.
Por ser a sua ética personalista, Wojtyła considerava que o bem moral por excelência consiste no ato do amor à pessoa. Em contrapartida, qualquer tipo de instrumentalização da pessoa, configura o mal moral. A percepção que temos da dignidade pessoal própria e dos nossos próximos, converte-se assim na regra fundamental de todo o nosso comportamento.
O cultivo das virtudes morais é importante, nesse sentido, porque cotidianamente encontramos dificuldades, internas e externas, para sermos bons, para cumprirmos essa regra fundamental, que Wojtyła chama de “norma personalista”.
A principal diferença, porém, entre a perspectiva cristã e a da “melhor versão de si mesmo”, ao menos do seu uso corriqueiro, é a da primazia da graça em todo esse caminho de crescimento do amor, de “amorização” que é a vida cristã.
Nesse sentido, gostaria de concluir citando Thomas Merton, no seu livro “A montanha dos sete patamares” (Vozes: 2005), sobre este importante assunto, do caráter indispensável da graça para o homem:
“Há um paradoxo no âmago da existência humana (…) o paradoxo é que a natureza humana em si mesma pode fazer muito pouco ou quase nada para resolver seus problemas mais importantes. Se nós seguirmos apenas nossa natureza, nossa própria filosofia, nosso próprio conceito de ética, fatalmente vamos acabar no inferno.
(…) Nossa natureza, que é um dom gratuito de Deus, foi-nos dada para ser aperfeiçoada e encarecida por outro dom gratuito. Este dom gratuito é a “graça santificante” (…) Se uma pessoa chegasse ao pináculo abstrato da perfeição natural, a obra de Deus não teria chegado à metade, estaria apenas começando, pois a obra verdadeira é a obra da graça, as virtudes infusas e os dons do Espírito Santo” (p. 155).