A Consciência e o Inconsciente

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Introdução

No mundo da Psicologia ouve-se falar muito do Inconsciente e do Subconsciente, de fato estes conceitos foram bastante desenvolvidos pela Psicanálise. Posteriormente, outras correntes psicológicas fizeram um aprofundamento sobre este tema. Porém, para compreender melhor este tema, vemos a importância de compreender primeiro o que significa a Consciência.

Na Psicologia, a Consciência ou a mente consciente é relacionada com a Atenção, tecnicamente a mente consciente seria uma apresentação lógica da Atenção. Por meio deste conceito psico-fisiológico, vemos que o homem consegue perceber e reagir diante da percepção.

A informação pré-consciente (subconsciente e inconsciente) seriam memórias armazenadas que não estamos usando em um dado tempo.  A maior parte do nosso comportamento cotidiano não é objeto de reflexão, da nossa atenção; e por isso não o consideramos como atos conscientes. Quando executamos a Atenção, pode ser feito por processos controlados ou automáticos, estes últimos costumam ser tarefas fáceis e ocorrem fora do conhecimento consciente. Quando surgem situações inesperados, aí prestamos atenção ao que realizamos. Quando realizamos atividades rotineiras, a nossa atenção se relaxa até quase o ponto de desaparecer, e isso é bom porque assim poupamos muita energia psíquica.

Desde uma aproximação mais integral do ser humano, que não só considera à pessoa somente como um ser psico-fisiológico, e sim com sua dimensão espiritual, vemos que existem dois níveis da Consciência (Ratzinger, 2010).

Anamnesis: O nível ontológico da consciência, ou a lei escrita em nossos corações. E acredita-se que essa verdade, essa lei, provem de Deus.

Conscientia: O nível do juízo e da decisão. Pois a consciência ilumina o juízo prático visando a tomada de decisões.

Também, encontramos no livro ‘El Elogio de la Conciencia’ de Joseph Ratzinger a seguinte definição: “A consciência não constitui uma faculdade independente e infalível; é um ato de juízo moral que se refere a uma opção responsável. A consciência reta é uma consciência devidamente iluminada pela fé”.

A base deste pensamento desenvolvido por Ratzinger a encontramos, na Constituição Pastoral ‘Gaudium et Spes’: “No fundo da própria consciência, o homem descobre uma lei que não se impôs a si mesmo, mas à qual deve obedecer; essa voz, que sempre o está a chamar ao amor do bem e fuga do mal, soa no momento oportuno, na intimidade do seu coração: faze isto, evita aquilo. O homem tem no coração uma lei escrita pelo próprio Deus; a sua dignidade está em obedecer-lhe, e por ela é que será julgado. A consciência é o centro mais secreto e o santuário do homem, no qual se encontra a sós com Deus, cuja voz se faz ouvir na intimidade do seu ser”. (Concilio Vaticano II. Gaudium et Spes, 16, 1965).

Dentro da ciência psicológica, encontramos uma relação com algumas definições, pois, também, a Consciência pode ser definida como a regra do bem dentro de nós, a voz da verdade dentro do homem e que considera a existência de uma transcendência nela, como por exemplo diz Viktor Frankl, “a Consciência é a voz da transcendência”. (Frankl, 1984).

Mente humana, níveis da mente

Consideramos que existem três níveis na mente humana, com os quais as pessoas podem se desenvolver pessoalmente. Estes três níveis são chamados: mente consciente, mente subconsciente e mente inconsciente.

A mente consciente é a mente lógica, racional e proativa, na qual ao pensar e raciocinar no dia a dia, nos leva a tomar as decisões em nossa vida, mantendo o controle dela, e conformando nosso caráter e personalidade.

A mente subconsciente é a mente que no momento não é consciente da informação e se encontra num nível um pouco mais profundo da mente consciente. Ela tem acesso a todas as nossas memórias passadas, e o que gerou e nós emotiva, afetiva e sentimentalmente. O objetivo desta mente subconsciente é controlar e tentar guiar a nossa vida por meio de tudo o que não compreendemos, mas que pode ir tomando controle da mente consciente. Um exemplo seria a pessoa que realiza compras compulsivas.

A mente inconsciente é a mente que se encontra ainda num nível mais profundo da mente subconsciente. Ela contém matéria esquecida, reprimida ou que nunca chegou ao conhecimento consciente. Podemos ir tendo controle sobre nossa mente subconsciente e inconsciente.

Para realizar um estudo mais aprofundado sobre o Inconsciente na Psicologia, devemo-nos lembrar que, na Filosofia, o termo Inconsciente já era conhecido e estudado, principalmente por Arthur Shopenhauer, embora este conceito já apareça com Friedrich Wilhelm Joseph von Schelling, quem no seu sistema filosófico coloca ao Inconsciente como um dos aspectos essências do absoluto. Shopenhauer, primeiro filosofo que nega o conhecimento puro, é quem depois formula uma verdadeira metafisica do inconsciente, também chamado de vontade que condicionará nossas ações e nossos pensamentos, fazendo que a pessoa sinta que não tudo o que passa por ela é controlável pelo consciente e conhecido. (Savater, 1995) diz que “a originalidade de Schopenhauer foi suspeitar que poderíamos estar condicionados desde dentro, pela vontade mesma: esta foi a via que depois seguiu Freud e a psicanálise”.

Na história da Psicologia, vemos que, os behavioristas se recusaram a reconhecer a existência do Inconsciente. Por outro lado, na Psicanálise, Freud viu no Inconsciente uma fonte essencial do comportamento. A escola psicanalítica fez um aporte muito importante ao mundo da saúde mental, a partir da dimensão psicológica, pois sustentando-nos na psicanálise, se faz impossível integrar fé e razão, pois a sua antropologia não contempla o homem como ser bio-psico-social-espiritual.  Segundo a aproximação psicanalítica, esta mente inconsciente busca, afastar-nos do perigo e aproximar-nos ao prazer, e a pessoa cada vez tem que tentar diminuir a zona desconhecida (inconsciente). O Inconsciente Psicanalítico é entendido com o aparelho psíquico constituído de três partes: “id”, ego e superego; no qual o “id” seria o inconsciente e caraterizado pelas pulsões e desejos. Na terapia psicanalítica, a pessoa necessariamente tem uma relação com o inconsciente, o qual trata de recordar o trauma para obter uma descarga emocional. Depois Freud abandonou este modelo, pois era muito simples, e passou para um modelo mais de mosaico (raiz da neurose de vários momentos na história), complementando com a sua Interpretação dos sonhos, a qual seria a estrada real para o Inconsciente. No fundo, vemos na Psicanálise uma “coisificação” da pessoa, pois ela é impulsionada por um “id”.

Porém, o Inconsciente na Psicologia não se resume somente à abordagem a partir da Psicanálise. A Cognição –uma das principais vertentes da Psicologia– não só envolve processos conscientes (pensar, sonhos, recordar, aprender, fantasia) senão, também, processos inconscientes. Por isso, na Cognição ou na Psicologia Cognitiva não só devemos estar interessados pelos fenômenos da Consciência, senão também, pelo Inconsciente Cognitivo. A ideia do Inconsciente Cognitivo, também a encontramos na Psicologia da Gestalt, que vem do Gestaltismo, o qual tem como grande tema a Percepção[1], e que por meio da Insight, obtemos conhecimento de forma intuitiva.

Inconsciente Cognitivo e Inconsciente Espiritual

O Inconsciente Cognitivo deve ser separado do Inconsciente Psicanalítico devido à metodologia de ambas, pois enquanto o Inconsciente Cognitivo é Experimental, o Inconsciente Psicanalítico é Hermenêutico.

O Inconsciente Cognitivo apresentou-se como um modelo alternativo sobre a mente inconsciente. A ideia central é a de que o cérebro efetua muitas operações complexas cujo resultado pode se transformar em conteúdo consciente, embora não tenhamos acesso às operações que originam este conteúdo (Kihlstrom e Cantor, 1985). Esta nova teoria sobre os processos inconscientes foi formulada pelo psicólogo John Kihlstrom, que cunhou a expressão “Inconsciente Cognitivo” em um artigo publicado na revista Science (Kihlstrom, 1987). Fundamentando-se no conceito de mente como mecanismo de processamento de informação, Kihlstrom utilizou a teoria computacional, a Psicologia Cognitiva e as Ciências Cognitivas como substrato teórico para entender o funcionamento consciente e inconsciente. Para Kihlstrom, o funcionamento mental envolve processos inconscientes e conteúdos conscientes. Os conteúdos conscientes provêm do processamento de informações, mas não estamos conscientes do processamento em si, somente do resultado. Esta nova conceptualização inclui processos como perseguição inconsciente de metas, por exemplo.

O professor Ap Dijksterhuis, também um estudoso do Inconsciente Cognitivo, diz: “dado que na Psicanálise o Inconsciente é o construto lógico central, ao passo que na abordagem da Cognição Social o Inconsciente é a ideia que se tem sobre processos desencadeados sem participação Consciente, mas que, ainda que subjacentes, exercem uma influência decisiva na cognição, na afetividade e em comportamentos e condutas sociais” (Ap. Dijksterhuis, 2010).

Nos últimos anos vemos que o Inconsciente Cognitivo está tomando mais destaque, por exemplo, (Kahneman, 2011) distingue dois níveis no processo cognitivo: nível consciente e nível inconsciente.

O Inconsciente Cognitivo, então, é o Inconsciente que afeta à totalidade da pessoa, pois quando uma pessoa está atenta no momento em que realiza uma atividade, está sendo influenciada pela sua inconsciência cognitiva. Vejamos que utilizamos a palavra afeta e não condiciona, a qual seria o Inconsciente Psicanalítico.

Na Logoterapia, a mente da pessoa profunda é Inconsciente, Pré-consciente e Consciente. Sendo esta última um órgão de sentido que poderia definir-se como “a faculdade de descobrir e localizar esse único sentido que se esconde detrás de cada situação” (Frankl, 1984).

Nesta nova teoria do Inconsciente Espiritual, Viktor Frankl, não só trata o impulsivo na pessoa, como foi feito pela Psicanálise, senão que a Logoterapia fala de Inconsciente Espiritual, porque é uma psicoterapia a partir do espiritual, já que introduz na parte médica o conceito do espiritual.

Se bem é certo que um aspecto marcante da Logoterapia é a abertura para a compreensão da experiência religiosa dos pacientes, quando esta se refere ao espiritual na pessoa, não se refere à religiosidade da pessoa e sim ao nous. Lembremos, que, na Antropologia da Logoterapia, o ser humano é uma pessoa espiritual composta de três dimensões: bio-psico-espiritual. Esta dimensão (nous) é uma dimensão que não dá para se destruir, é a dimensão do que a pessoa dá para o mundo, em outras palavras a liberdade de vontade. Noogenico quer dizer, proveniente do espirito. A pessoa espiritual na sua dimensão mais profunda é sempre inconsciente, pois o espiritual é inconsciente no mais profundo como no mais alto da estrutura da pessoa. Vemos, pois, que esta dimensão noética ou espiritual pode ser consciente, como inconsciente.

Como já foi mencionado, na Psicoterapia, se considera o inconsciente, pois vemos uma tentativa de fazer consciente algo inconsciente. Na Psicanálise, este processo é forçado, pois não obtenho consciência de mim mesmo a partir de meu próprio eu, e sim a partir do id. Na Logoterapia, este processo de fazer consciente algo inconsciente é mais natural, porque se acredita na transcendência da consciência, pois são coisas que não procedem da pessoa unicamente. Se bem a consciência pertence ao ser humano, esta alcança uma profundidade inconsciente, pois a consciência se encontra imersa no inconsciente. É por essa razão que na Logoterapia encontramos o conceito de suprasentido, ou seja, aquilo que ultrapassa a compreensão do homem. O sentido supra-individual é o que está referido a valores supraindividuais (conforme a normas, o crítico-objetivo). Concluindo, podemos dizer que o Inconsciente Espiritual seria englobar o espiritual, também, dentro do Inconsciente. A pessoa não é impulsionada por um “id”, como na Psicanálise, e sim, por um “eu” que decide e que é responsável e livre.

Conclusão

Realizado este estudo introdutório sobre a mente humana, primeiramente viu-se importância de compreender o que significa a Consciência, pois ela deve guiar e iluminar o juízo prático visando a tomada de decisões das pessoas. E é só a partir dela devo me aproximar a estudar e querer compreender o Inconsciente, Subconsciente ou Pré-consciente.

As pessoas estão chamadas a seguir sua própria consciência, mas também estão obrigadas a formá-la. Se entendemos a Consciência como a voz da verdade dentro do homem, Só podemos ser servos dela, pois a entendemos como fenômeno transcendente ao mero ser do homem. A Consciência, então é uma Guia para o homem, quem deve obedecer a sua consciência, nisto temos um grande exemplo na vida de Santo Tomás Moro.

Por outro lado, ao estudar o homem psíquico não nos referimos à sua consciência moral, e sim a um conceito psico-fisiológico no qual por meio da consciência o homem consegue perceber e de reagir diante da percepção. Porém, é sumamente importante que as pessoas que se dedicam a estudar e atender nesta dimensão psicológica, tenham sempre uma aproximação à pessoa em sua totalidade e integridade, cultivando um pensamento unitário-integral, ou seja, uma visão trial do ser humano. Todo terapeuta em qualquer nível que esteja agindo, não pode prescindir da dimensão espiritual do ser humano.

Hoje em dia existem psicologismos, nos quais há uma exaltação do inconsciente e uma desaparição de Deus. Pensamos, que esta realidade, não deve fazer-nos cair no extremo de falar formalmente de uma psicologia cristã, porém, sim podemos plantear uma orientação cristã do exercício profissional psicológico. Achamos sumamente importante buscar a Integração de escolas psicológicas, para poder abordar os tratamentos psicológicos, considerando que o homem é um ser bio-psico-socio-espiritual.


Referências

  • Beck, A. Além da Crença: Uma Teoria de Modos, Personalidade e Psicopatologia. In P. Salkovskis & M. Paul (Ed.). Fronteiras da Terapia Cognitiva. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004.
  • CONSTITUIÇÃO PASTORAL GAUDIUM ET SPES. Documentos do Concílio Vaticano II. São Paulo: Paulus, 1997.
  • DIJKSTERHUIS, Ap. Automaticity and the Unconscious. Handbook of Social Psychology Radboud University, Nijmegen, Behavioral Science Institute, Nijmegen, The Netherlands, 2010.
  • FRANKL, Viktor. La presencia ignorada de Dios. Barcelona: Editorial Herder, 1984.
  • Kahneman, Daniel. Thinking, Fast and Slow 2011. New York: Farrar, Straus and Giroux, 2011.
  • KIHLSTROM, John. CANTOR, Nancy. Social Intelligence. The cognitive basis of personality. California: Sage Publications, 1985.
  • KIHLSTROM, John. The cognitive unconscious. Published Online: <science.sciencemag.org/content/237/4821/1445.long>, 1987.
  • OVEJAS, Patricia. Psicoanálisis y Logoterapia en el tratamiento de las neurosis de transferencia. Buenos Aires: Ed. San Pablo. 2011.
  • RATZINGER, Joseph. El Elogio de la Conciencia. Madrid: Ediciones Palabra, 2010.
  • SAVATER, Fernando. Invitación a la ética. Barcelona: Anagrama. 1995.

Nota

[1] A percepção é diferente do pensamento, pois o pensamento se baseia em produtos que saem da percepção.

Nasceu em Lima, Peru, em 1983. Membro do Sodalício de Vida Cristã e mora no Brasil desde 2008. Mestre em Psicologia e Bacharel em Administração. Realizou por alguns anos estudos de Filosofia. Atualmente estuda um Diplomado de Antropologia Cristã da Universidad San Pablo. É membro fundador da Associação Reconciliatio – Psicologia Integral.

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