Caminho para Deus 122 – A vida cristã hoje

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Quem se encontrou verdadeiramente com o Senhor Jesus coloca nEle «o sentido último da sua própria vida  podendo dizer com o Apóstolo: “Para mim, o viver é Cristo”» [1].

É o próprio Senhor Jesus que nos fala de sua missão: «Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância»[2]. Pela fé conhecemos que Ele, o Verbo eterno, Deus de Deus e Luz da Luz, enviado pelo Pai, se encarnou em Maria Virgem por obra do Espírito Santo. Assumindo plenamente nossa natureza humana, fazendo-se igual a nós em tudo menos no pecado, carregou sobre si nossos pecados e oferecendo-se Ele mesmo em sacrifício nos reconciliou com o Pai no Altar da Cruz[3]. Mas Aquele que, livremente e movido pelo amor, deu sua vida por nós na Cruz, tem também «poder para retomá-la de novo»[4]. Ele, Senhor da Vida e vida de todo homem[5], RESSUSCITOU!, e ressuscitando nos deu, pelo dom de seu Espírito[6], uma nova vida: «Se alguém está em Cristo, é nova criatura. Passaram-se as coisas antigas; eis que se fez uma realidade nova»[7]. A uma nova criatura, corresponde uma vida nova: a vida em Cristo, a vida de Cristo, a vida cristã…

1. A vida

Antes de mais nada, o que devemos entender por “vida”? Ao falar de “vida” fazemos referência em primeiro lugar a um espaço de tempo que transcorre entre a concepção até a morte, com todos os processos naturais que nesse lapso se desenvolvem.

Mas na Sagrada Escritura o significado da palavra “vida” não se reduz a este “lapso de tempo”, ou a um simples “estar no mundo”. Seu significado vai muito além: inclui a soma e plenitude de bens que pode alcançar o ser humano em sua existência terrena. Portanto, por vida não devemos entender somente o oposto a não existir, ou o oposto à morte, mas também o oposto a todo mal físico, moral ou espiritual que afeta ou degrada a vida humana. Vida, neste sentido, é uma vida plena, autêntica, uma vida que corresponde à dignidade e grandeza do ser humano.

2. A vida cristã

Com o Senhor Jesus a vida humana adquire seu sentido mais pleno, porque nEle o ser humano pode alcançar sua máxima grandeza; nEle e por Ele pode alcançar todos os bens ansiados e reservados para ele; nEle, por Ele e com Ele pode alcançar o pleno desdobramento e total realização de sua existência. e o mais importante é que este processo e desdobramento, que já se inicia no peregrinar terreno, culminará na vida eterna onde Deus preparou para aqueles que o amam «o que os olhos não viram, os ouvidos ouviram, e o coração do homem não percebeu»[8]. A vida que Cristo nos promete e comunica é a vida em total plenitude e por toda a eternidade! Vida que é participação da Vida ressuscitada do Senhor, que é portanto liberação do mal, do pecado, da morte, de todo pranto ou dor[9], vida que é participação e comunhão da mesma Vida e natureza divina[10], fonte de gozo inefável e inesgotável.

Assim, pois, a vida, quando é participação da própria vida do Senhor Jesus, chega a ser, já neste peregrinar terreno, vida intensa, qualitativamente intensa. Isto muitas vezes nem se entende nem se vive no mundo de hoje. Quantos vêm ou querem fazer ver a vida cristã como uma vida obscura, triste, aborrecida, apagada, quando uma vida cristã levada autenticamente é exatamente o contrário: uma vida transida de fé, de esperança e transbordante de amor; uma vida luminosa, radiante de gozo, plena de sentido, inundada de paz! Inclusive em meio às dificuldades.

3. Obstáculos à vida cristã hoje

É grande a quantidade de elementos anti-vida que estão presentes em nosso tempo, elementos que contradizem e obscurecem a vida cristã. A «cultura de morte» avança dia a dia destruindo ou degradando a vida de tantos, desde os concebidos não nascidos até as pessoas cuja vida é considerada inútil.

Além disso, nos inícios do terceiro milênio encontramos muitos obstáculos e dificuldades para viver a vida cristã: a secularização, que procura apagar todo rastro de Deus em nossas sociedades de tradição cristã; a indiferença religiosa; o agnosticismo funcional pelo qual muitos que dizem crer em Deus vivem como se Deus não existisse; o relativismo filosófico pelo qual muitos pensam que não existe uma verdade para todos mas que cada um tem sua verdade; o relativismo moral pelo qual o mal objetivo se torna “normal” porque “todo o mundo o faz ou o aceita”; as campanhas anti-vida; o bombardeio sensual e hedonista, que apresenta continuamente uma visão do homem e da mulher reduzida a um objeto de prazer; o ataque contínuo à instituição familiar; as campanhas de desprestígio contra a Igreja e seus filhos nos meios de comunicação; o ambiente negativo que faz com que os próprios católicos tenham vergonha de viver e mostrar sua fé, fazendo-lhes crer que são uma minoria retrógrada, com um desejo de relegar à Igreja à sacristia…

Este conjunto de características constitui um panorama que conduz a pessoa humana a perder de vista o que é a vida autêntica. Produz-se então uma verdadeira demissão, um abandono do humano.

4. Como tochas radiantes…

Diante de tantas dificuldades, obstáculos, desafios… como reagir? Nossa resposta não há de ser de desânimo, desalento ou um medo que leve a ocultar-nos. Nossa resposta há de ser viver mais intensamente nossa vida cristã: «Se, pois, encontrares Cristo —exortava S.S. João Paulo II—, vivei Cristo, vivei com Cristo!»[11]. Para poder anunciar a Cristo de modo convincente é necessário abrir-se à Vida, aderir-se a Ela e deixar-se transformar em Vida. Acolher a Vida e dizer: Minha vida é Cristo. E viver a vida de Cristo na Igreja.

Deste modo a vida do cristão, hoje e sempre, se assemelha a uma lâmpada posta sobre o candelabro: sua missão é iluminar «a todos os que estão na casa»[12]. São Paulo o dirá a seu modo, recordando que os cristãos ao levarem uma conduta irreprimível brilham «como astros no mundo»[13]. Não temamos viver intensamente a vida cristã e mostrar o que somos, com convicção, com simplicidade. Tenhamos a certeza de que perante a Luz, as trevas não triunfam mas retrocedem, e os que somos de Cristo e o levamos dentro teremos —não por mérito próprio, mas por seu amor misericordioso— a  força da Luz em nós. Não ocultemos essa Luz sob um celamim[14]! Temos que irradiar Cristo!

Recordemos em todo momento que para fazer Cristo visível e audível aos homens e mulheres de nosso tempo, é imprescindível levá-lo no interior, de modo que seja Ele quem viva em cada um. Como viver uma vida intensa, se a presença de Cristo não é intensa em mim? Como viver uma vida intensa, se Cristo não chega a ser o centro de meus pensamentos, de meus afetos, de minha atividade? Como viver uma vida cristã intensa se para mim a vida não chega a ser Cristo mesmo? Para viver uma vida cristã intensa é necessária uma vida espiritual intensa.

Recordemos também que essa mesma vida espiritual intensa, se é autêntica, nos leva ao anúncio da boa Nova, ao apostolado. A vida cristã sobreabunda em nossos corações e nos leva a superar os obstáculos externos ou internos para alcanzar as pessoas que nos rodeiam.

Essa é nossa tarefa, essa é nossa missão, deixar-nos cristificar, receber a Palavra Luminosa, acolhê-la, anunciá-la, permitindo que sua luz transpareça em nossa vida diária através de nossas boas obras: «Brilhe do mesmo modo a vossa luz diante dos homens, para que vendo as vossas boas obras,  eles glorifiquem vosso Pai que está nos céus»[15].

Citações para a oração

Cristo é a Vida: Jo 14,6; Ele é fonte de vida para o ser humano: Jo 1,4; Jo 5,21.26.40; Jo 8,12; Ele é o Pão da Vida: Jo 6,35.53-54.

Ele veio para que tenhamos vida: Jo 10,10.

Todo aquele que escuta sua palavra e crê nEle tem vida eterna: Jo 3,16. 36; Jo 5,24.

Somente Ele tem palavras de vida eterna: Jo 6,68; Ele nos promete a vida eterna: Jo 4,14; Jo 10,10.28; Jo 11,25.

Vida cristã é viver para o Senhor: 2Cor 5,14-15; Rm 14,7-9; é permitir que Cristo viva em mim: Gl 2,20; é fazer que Cristo seja minha vida: Fl 1,21.

Levando uma vida cristã intensa, levando Cristo em mim, estou chamado a iluminar a muitos: Jo 5,35; Mt 5,15-16.

INTERIORIZANDO

Como nos diz o apóstolo São Paulo: «portanto, que está em Cristo, é uma nova criação; passou o velho, tudo é novo» (2Cor 5,17)

  • O que significa que esteja chamado a uma vida nova em Cristo?

«Cristo, o novo Adão, na mesma revelação do mistério do Pai e de seu amor, manifesta plenamente o homem ao próprio homem e lhe descobre a grandeza de sua vocação». (Gaudium et spes 22)

  • Por que o Senhor Jesus pode manifestar plenamente quem somos?
  • Frente ao imenso horizonte para o qual nos chama o Senhor, como você lhe está respondendo?

O apóstolo São Paulo, manifestando sua íntima união com o Senhor Jesus, expressava em sua carta aos Filipenses: «Para mim a vida é Cristo» (Fp 1,21).

  • O Senhor Jesus é o centro de minha vida?
  • Como estou vivendo no cotidiano minha vida cristã?
  • Que meios concretos vou pôr para fortalecer mais minha vida cristã?

Devemos ser conscientes das dificuldades que o mundo de hoje nos apresenta para ser coerentes com nossa vida cristã.

  • Quais são as dificuldades pessoais que tenho para ser coerente com minha vida cristã?
  • Quais são as dificuldades que o mundo me apresenta?

Papa João Paulo II, durante a XV Jornada Mundial da Juventude realizada em Roma no ano 2000, dizia-nos: «Queridos amigos, também hoje acreditar em Jesus, seguir  Jesus seguindo as pegadas de Pedro, de Tomás, dos primeiros Apóstolos e testemunhas, comporta uma opção por Ele e, não poucas vezes, é como um novo martírio: o martírio de quem, hoje como ontem, é chamado a ir contra corrente para seguir ao divino Professor, para seguir “o Cordeiro onde quer que vá” (Ap 14,4). Não por acaso, queridos jovens, quis que durante o Ano Santo fossem recordados no Coliseu as testemunhas da fé do século XX. Possivelmente a vós não lhes pedirá o sangue, mas sim certamente a fidelidade a Cristo. Uma fidelidade que se tem que viver nas situações de cada dia».

  • O que lhe dizem estas palavras do Santo Padre?
  • Você está disposto a se esforçar por cooperar com a graça e ser como “tocha viva” no meio do mundo?
  • O que você vai fazer para irradiar a luz de Cristo aos outros?

Que Santa Maria, nossa Mãe, interceda para que sejamos cada dia mais coerentes com o dom da vida cristã recebido em nosso Batismo.

Por nossas necessidades

Santa Maria,
Mãe amorosa,
olhe com compaixão
nossas necessidades
e nos conceda seu amparo
intercedendo com insistência
ante o Altíssimo
para as ver resolvidas.
Que assim seja.
Amém.

Perguntas para o diálogo

  • O que significa para mim a vida em Cristo? Que implicâncias tem para minha vida concreta?
  • Como estou vivendo minha vida cristã? Como está minha coerência com o dom que recebi no Batismo?
  • Em minha vivência da vida cristã, quais são os obstáculos do mundo que mais me afetam? Por que?
  • Que meios concretos vou pôr para cooperar com a graça e superar estes obstáculos?
  • Estou disposto a me esforçar por ser uma “tocha viva” que irradie a luz do Senhor no meio do mundo?


[1] S.S. João Paulo II, Vita consecrata, 15.

[2] Jo 10,10.

[3] Ver 2 Cor 5,18-19.

[4] Jo 10,18.

[5] Ver Jo 1,4.

[6] Ver Jo 20,19-22.

[7] 2Cor 5,17.

[8] 1Cor 2,9.

[9] Ver Ap 21,4.

[10] Ver 2Pd 1,4.

[11] S.S. João Paulo II, Homilía na Catedral de Santo Domingo, 26/1/79, 2.

[12] Mt 5,15.

[13] Fl 2,15.

[14] Celamim – Antiga medida que corresponde a um monte de grãos equivalente a 2,27 litros.

[15] Mt 5,16.

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