Caminho para Deus 224 – O ano da fé

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“Decidi proclamar um Ano da Fé. Este terá início a 11 de Outubro de 2012, no cinquentenário da abertura do Concílio Vaticano II, e terminará na Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, a 24 de Novembro de 2013. ”[1].

Com estas palavras o Santo Padre Bento XVI empreende com toda a Igreja uma apaixonante aventura, um grande desafio: “Redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar, com evidência sempre maior, a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo. ”[2]

Cada pessoa está convidada a percorrer livremente o caminho da fé, pondo todo o empenho de sua inteligência e de sua vontade para acolher esse dom divino. Trata-se de viver a fé em Deus Unoe Trino, que a Igreja conservou, custodiou e irradiou ao longo de dois mil anos. Professamos o “Credo”, herança que nos deixaram os próprios Apóstolos; celebramos os sacramentos tal como o faziam os primeiros cristãos; como eles, vivemos segundo a lei de Cristo e procuramos construir uma sociedade enraizada nos valores do Evangelho; oramos como Cristo nos ensinou e esperamos a realização de suas promessas. Nossa fé católica, ao mesmo tempo em que é um ato pessoal (“creio”) se professa sempre em comunhão com a Igreja (“cremos”) de todos os tempos e lugares.

Quando São Paulo começou a viajar anunciando o Evangelho de Jesus Cristo, alegrou-se porque, em um momento, “a porta da fé” se abriu também para os gregos[3]. Hoje em dia essa “porta” continua aberta para todos através do Batismo. O primeiro sacramento é o início de um caminho de fé que nos conduz para a santidade com o impulso do Espírito Santo. Inspirado nestas metáforas da “porta” e do “caminho”, o Santo Padre convocou este Ano da fé através de uma Carta Apostólica intitulada precisamente Porta fidei (A porta da fé).

Redescobrindo o tesouro da Fé

Do que trata este evento? Por que foi convocado pelo Santo Padre?

O Papa Bento XVI propôs o Ano da fé como «um convite a uma autêntica e renovada conversão ao Senhor, único Salvador do mundo»[4]. Devemos «descobrir novamente os conteúdos da fé professada, celebrada, vivida e rezada e refletir sobre o próprio ato com que se crê,»[5]. Em todas as famílias e grupos, paróquias e dioceses, movimentos e comunidades, estamos convidados a interiorizar o que cremos e a amar o Senhor com todo o nosso coração para poder anunciá-lo com alegria, convencimento e vitalidade.

O Ano da fé deve animar-nos a anunciar o Evangelho com mais valentia, a «dar razão de nossa esperança»[6], assumindo mais radicalmente nosso compromisso cristão.

Um mundo cheio de incredulidade

A iniciativa tomada pelo Santo Padre ao lançar o Ano da fé se dá em um contexto histórico. Em nossa época os valores do Evangelho são com frequência negados por amplos setores da sociedade «por causa de uma profunda crise de fé que afeta a muitas pessoas»[7]. A incredulidade, que consiste em menosprezar a verdade revelada ou em não querer aceitá-la[8], parece ser uma nota característica de muitos ambientes de nosso mundo.

Enumeremos algumas das correntes de nosso tempo que expressam uma falta de fé:

Em algumas pessoas a incredulidade chega a ponto de ser um explícito ateísmo, quer dizer, «a negação da existência de Deus»[9]. Junto a esta está o agnosticismo, pelo qual se rechaça «toda verdade absoluta»[10]. O agnosticismo passou a ser uma forte corrente, sobretudo a nível prático; leva a viver como se Deus não existisse, pondo-o, em certo sentido, entre parêntese.

Como resultado do agnosticismo, as verdades absolutas começam a ser rechaçadas. Quando alguém afirma uma verdade revelada por Deus ou as consequências dessa verdade — que podem ser incômodas ou difíceis de viver — tacha-se de “fundamentalismo” ou “dogmatismo”. Portanto, relativizar todas as verdades segundo a própria conveniência e gosto parece ser a saída mais comum nos tempos atuais. Vamos constituindo uma “ditadura do relativismo” que não reconhece nada como definitivo e que deixa como última medida somente o próprio eu e seus desejos[11].

Em muitos lugares se vê muita ignorância a respeito da fé. Isto favorece que o cristão despreparado abra suas portas a uma mistura de crenças pseudo religiosas, a uma espécie de espiritualidade “mística” apoiada em esoterismo e falsas esperanças.

O secularismo, como tentativa de tirar deus da vida pública, e o materialismo também afetam o pensamento e a vida de muitas pessoas. Pouco a pouco se impõe uma visão superficial da vida e a busca de respostas meramente humanas e horizontais, diminuindo a capacidade de confiar em Deus eem sua Providência. Por outro lado, percebe-se com força a tendência a procurar a própria segurança e felicidade nos bens terrenos, no conforto e no prazer.

Mas também devemos considerar, como uma das consequências da incredulidade do homem contemporâneo, «a reação crítica contra as religiões, e, certamente em algumas zonas do mundo, sobretudo contra a religião cristã. Por isso, nesta gênese do ateísmo podem ter parte não pequena os próprios crentes que, com o descuido da educação religiosa, ou com a exposição inadequada da doutrina, ou até com os defeitos de sua vida religiosa, moral e social, velaram mais do que revelaram o genuíno rosto de Deus e da religião»[12].

A resposta da Igreja

Diante desse panorama de incredulidade o Papa Bento XVI nos exorta a «intensificar a reflexão sobre a fé, para ajudar todos os crentes em Cristo a se tornarem mais conscientes e a revigorarem a sua adesão ao Evangelho, sobretudo num momento de profunda mudança como este que a humanidade está vivendo.»[13]. Esse esforço se realiza marcado por dois grandes acontecimentos: a celebração dos 50 anos do Concílio Vaticano II e os 20 anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica.

O Ano da fé começa na mesma data da inauguração do Concílio Vaticano II[14]. Para a Igreja o Concílio foi um momento de renovação em sua identidade e missão. Meio século depois devemos voltar a ler, estudar, interiorizar e aplicar os textos do Concílio, que como dizia o Beato João Paulo II, «não perdem seu valor nem seu esplendor». O Vaticano II é «a grande graça da qual a Igreja se beneficiou no século XX. Com o Concílio nos ofereceu uma bússola segura para nos orientar no caminho do século que começa»[15].

Um dos frutos do Concílio Vaticano II foi, precisamente, a redação de um novo Catecismo da Igreja Católica, publicado em 1992. No Catecismo «sobressai a riqueza de doutrina que a Igreja acolheu, guardou e ofereceu durante os seus dois mil anos de história. Desde a Sagrada Escritura aos Padres da Igreja, desde os Mestres de teologia aos Santos que atravessaram os séculos, o Catecismo oferece uma memória permanente dos inúmeros modos em que a Igreja meditou sobre a fé e progrediu na doutrina para dar certeza aos crentes na sua vida de fé.»[16]. Neste Ano o Catecismo poderá ser um «um verdadeiro instrumento de apoio da fé, sobretudo para os que têm a peito a formação dos cristãos, tão determinante no nosso contexto cultural»[17].

Como filhos da Igreja estamos chamados a acolher o convite do Santo Padre a viver intensamente este Ano da fé. O estudo, a celebração, a meditação e a vivência de nossa fé nos deve levar a crescer em santidade, para assim dar frutos em nosso serviço e nosso apostolado.

CITAÇÕES PARA A ORAÇÃO

A porta da fé se abre para todos: At 14,27

A fé atua pelo amor: Gál 5,6; Tg 2, 14-18

A fé se converte em critério para nossa ação: Rom 12,2;Cl 3, 9-10; Ef 4, 20-29; 2Cor 5,17

Maria, modelo de fé: Lc 1,45

PERGUNTAS PARA O DIÁLOGO

1.  Qual é a intenção do Santo Padre ao proclamar o Ano da fé?

2.  Quais são os desafios que devemos enfrentar perante o mundo que sofre a falta de fé?

3.  O que foi o Concílio Vaticano II? Que importância tem para a Igreja hoje?

4.  Como posso estudar o Catecismo de modo que me ajude a crescer em minha compreensão da fé que professamos?

TRABALHO DE INTERIORIZAÇÃO

1.  O Papa Bento XVI nos diz que, «durante este tempo, teremos o olhar fixo em Jesus Cristo, “que inicia e completa nossa fé”» (Heb 12,2).

Pergunte a si mesmo: Tenho o olhar posto em Jesus? Permito que, pela fé, Ele habite em meu interior? Conheço Jesus Cristo? Conheço sua Igreja e a fé que ela professa?

2.  Alguns dias antes de ser eleito Papa, o então Cardeal Joseph Ratzinger dizia em uma homilia:

«Quantos ventos de doutrina conhecemos durante estes últimos decênios! Quantas correntes ideológicas! Quantas modas de pensamento!… O pequeno barco do pensamento de muitos cristãos foi sacudido frequentemente por estas ondas, levado de um extremo ao outro: do marxismo ao liberalismo, até a libertinagem; do coletivismo ao individualismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso; do agnosticismo ao sincretismo, etc. Cada dia nascem novas seitas e se realiza o que diz são Paulo sobre o engano dos homens, sobre a astúcia que tende a induzir ao engano (ver Ef 4,14). A quem tem uma fé clara, segundo o Credo da Igreja, frequentemente se aplica a etiqueta de fundamentalismo. Enquanto que o relativismo, quer dizer, deixar-se “levar à deriva por qualquer vento de doutrina”, parece ser a única atitude adequada nos tempos atuais. Se vai constituindo uma ditadura do relativismo que não reconhece nada como definitivo e que deixa como última medida só o próprio eu e seus desejos.

Nós, porém, temos outra medida: o Filho de Deus, o homem verdadeiro. Ele é a medida do verdadeiro humanismo. Não é “adulta” uma fé que segue as ondas da moda e a última novidade; adulta e amadurecida é uma fé profundamente arraigada na amizade com Cristo. Esta amizade nos abre a tudo o que é bom e nos dá o critério para discernir entre o verdadeiro e o falso, entre o engano e a verdade. Devemos amadurecer esta fé adulta; devemos guiar a grei de Cristo a esta fé. Esta fé — só a fé — cria unidade e se realiza na caridade»[18].

Você se deixa levar pelos “ventos de doutrina” e pelas “modas de pensamento” do mundo? Você se conforma vivendo na “ditadura do relativismo”? Quão bem formada é sua fé? Você crê que já possui uma fé “adulta”? Caso contrário, o que falta para tê-la?

3. O Catecismo nos ensina que:

«A Virgem Maria realiza da maneira mais perfeita a obediência da fé. Na fé, Maria acolheu o anúncio e a promessa que lhe trazia o anjo Gabriel, acreditando que “nada é impossível para Deus” (Lc 1,37; cf. Gen 18,14) e dando seu assentimento: “Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo sua palavra” (Lc 1,38). Isabel a saudou: “Ditosa a que acreditou que se cumpririam as coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor!” (Lc 1,45). Por esta fé todas as gerações a proclamarão bem-aventurada (cf. Lc 1,48).

Durante toda sua vida, e até sua última provação (ver Lc 2,35), quando Jesus, seu filho, morreu na cruz, sua fé não vacilou. Maria não cessou de acreditar no “cumprimento” da palavra de Deus. Por tudo isso, a Igreja venera em Maria a realização mais pura da fé»[19].

Neste Ano da fé, que meios posso pôr para ter uma fé semelhante a de Santa Maria?

4. Como sugestão, pode-se propor aprender ou voltar a aprofundar nos pontos centrais da fé católica: o Credo, os sete Sacramentos, os Dez Mandamentos e a oração do Pai Nosso. Para isso, você conta com o Catecismo da Igreja Católica. Você o tem? Se não tiver, o que te falta para adquirir um?


[1] S.S. Bento XVI, Porta Fidei, 4

[2] S.S. Bento XVI, Porta Fidei, 2

[3] Cf. At 14, 27.

[4] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 6.

[5] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 9.

[6] 1Pe 3, 15.

[7] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 2.

[8] Catecismo da Igreja Católica, 2089.

[9] Catecismo da Igreja Católica, 2125.

[10] Gaudium et spes, 19.

[11] Ver Card. Joseph Ratzinger, Homilía na Missa Pro eligendo Pontifice, 18 de abril de 2005.

[12] Gaudium et spes, 19.

[13] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 8.

[14] O Concílio foi inaugurado no dia 11 de outubro de 1962 pelo Beato João XXIII.

[15] S.S. João Paulo II, Novo millenio ineunte, 57.

[16] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 11.

[17] S.S. Bento XVI, Porta fidei, 12.

[18] Card. Joseph Ratzinger, Homilía na Missa Pro eligendo Pontifice, 18 de abril de 2005.

[19] Catecismo da Igreja Católica, nn. 148-149.

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